Resenha: Ele Está de Volta

Resenha

Ele Está de Volta

Autor: Timus Vermes

Editora: Intrínseca

Páginas: 304

Sinopse:

Berlim, 2011. Adolf Hitler acorda num terreno baldio. Vivo.

As coisas mudaram: não há mais Eva Braun, nem partido nazista, nem guerra. Hitler mal pode identificar sua amada pátria, infestada de imigrantes e governada por uma mulher. As pessoas, claro, o reconhecem como um imitador talentoso que se recusa a sair do personagem. Até que o impensável acontece: o discurso de Hitler torna-se um viral, um campeão de audiência no YouTube, ele ganha o próprio programa de televisão e todos querem ouvi-lo. Tudo isso enquanto tenta convencer as pessoas de que sim, ele é realmente quem diz ser, e, sim, ele quer mesmo dizer o que está dizendo.

Ele está de volta é uma sátira mordaz sobre a sociedade contemporânea governada pela mídia. Uma história bizarramente inteligente, bizarramente engraçada e bizarramente plausível contada pela perspectiva de um personagem repulsivo, carismático e até mesmo ridículo, mas indiscutivelmente marcante.

OPINIÃO DELE:

A história do livro me conquistou logo que li as primeiras linhas de sua sinopse. Oras, o Hitler acordando no mundo atual e virando um personagem caricato e apresentador de televisão certamente deve proporcionar gargalhadas durante toda a leitura, não? Finalmente um livro que interromperia a série de decepções que eu tivera nas últimas leituras. Afinal, a maioria foram expectativas criadas por outros, mas esse não... esse eu mesmo tinha criado a expectativa. Comecei a ler pensando que 300 páginas seria muito pouco, infelizmente. Mas não foi bem assim. As 300 páginas acabaram por se tornar um fardo.

O que aconteceria se um crápula como Hitler vivesse no mundo atual? É um tema ótimo, oras. Imagina quantas surpresas, quantas dificuldades e quantos problemas ele teria que enfrentar... Ainda mais se quisesse expor suas ideias em um mundo cuja maioria é radicalmente contra seus ideais. Além de que ninguém acreditaria que seria, de fato, o Hitler original, mas apenas um imitador muito bom. Após as dificuldades iniciais de acordar em um mundo totalmente novo 66 anos após sua "morte", eventualmente ele consegue apoio de um jornaleiro que o acha um tipo diferente. É, então, apresentado a dois executivos de uma produtora que resolve lhe dar uma participação em um programa de comédia, dividindo o palco com um apresentador turco por um pequeno tempo. Mas seus vídeos se viralizam, seu sucesso se espalha... E logo Hitler é visto como um superstar.

Logo que comprei o livro, imaginei como seria o desenvolvimento do livro: o autor pegaria os ideais do nazismo, exacerbaria-os e adaptaria ao presente. Uma forma cômica de apresentar os absurdos de um passado não tão recente. Provavelmente não seria um livro muito profundo, mas com esse enredo não deveria esperar isso dele, e nem o autor teria tal propósito, então tudo bem... Mas os ideais não foram ridicularizados. Seus pensamentos não foram exacerbados. Apenas em alguns trechos há uma ridicularização deles. Mas na maior parte, passam incólumes. Talvez eles sejam mais sutis do que eu penso e, por isso, não os tenha entendido. Com tamanha fama, provavelmente era essa a resposta, e eu que não tivesse sido capaz de notar. Entretanto, quanto mais eu lia, menos eu ia achando aquilo reversível ou sem intenção.

Comprei esperando mais frases como 

"o que mais me irrita nessas pessoas matutinas é o maldito bom humor, como se elas já estivessem acordadas há três horas e tivessem conquistado a França nesse meio tempo" 

ou 

"por isso, passei as três horas e meia seguintes no computador com um simulador de rastreamento de minas chamado Campo Minado"

mas me surpreendi ao ler tantas passagens do tipo 

"E apesar de reconhecida a necessidade de exterminar milhões de judeus - e havia essa quantidade toda naquela época -, sempre se encontrará um alemão compassivo e simplório que pensa: 'ah, bem, esse judeu nem era tão ruim assim no fim das contas'. Seria até possível aguentar esse ou aquele judeu por mais alguns anos"

mas sem nenhuma piada em seguida, nenhum sinal enfatizando o quanto isso foi absurdo. Então minhas expectativas e teorias ruíram. 

Mais pro fim do livro, percebi que talvez a intenção do autor fosse criar uma espécie de nova Revolução dos Bichos, do Orwell... Talvez um alerta para a sociedade alemã atual, que parece permitir o surgimento de seitas e grupos com ideias muito similares às nazistas. O perigo desses sintomas talvez fosse sua motivação. Isso explicaria o tanto de referências a personagens, locais e acontecimentos reais, mas familiares apenas aos nacionais daquele país. 

Caso seja isso mesmo, não acho que o autor foi muito bem sucedido.

Acho que para se escrever sobre um assunto desses, deve-se ter sempre consciência do risco que representa, dos cuidados necessários para não ultrapassar barreiras e acabar incentivando a perpetuação desse discurso. É provável que o autor tenha caído no mesmo erro que ele tenta nos alertar. Ou talvez apenas eu não tenha conseguido entendê-lo totalmente.

Mas, as vezes, alguns trechos tão sutis me fazem repensar essas hipóteses, como por exemplo:

"- O senhor não precisa ir?

- Todos me disseram isso também no inverno de 1941"

NOTA DELE: